Eu me lembro exatamente como se fosse hoje do momento em que sai do cinema, em 2013, tomado pela empolgação, depois de assistir “O Homem de Aço”. Lembro de dizer para a minha esposa: “Adorei o filme. Ele é diferente de todos os filmes de super-herói que já assisti”. Então fui para casa e aguardei ansiosamente pelas críticas e resenhas dos principais sites que acompanhava na época (alguns ainda acompanho).

A decepção veio nessa hora.

Por algum motivo que eu ainda não consigo entender, já que a maioria das opiniões não deixou isso muito claro, a maioria das pessoas não gostou do filme. Eu passava horas em discussões acaloradas com os meus amigos tentando convencê-los do potencial do filme, mas, geralmente, só conseguia alimentar a briga.

Três anos se passaram e agora nos vemos aqui, em 2016, diante do novo longa de Zack Snyder que, ora vejam só, tem como protagonista o mesmo personagem. E, novamente, me vejo sozinho num mar de críticas e ódio. Será que sou a única pessoa que gostou do filme?

Zack Snyder dirige Ben Affleck
Zack Snyder dirige Ben Affleck

Não acredito que seja isso. O grande problema, na minha forma de pensar, é essa necessidade de obrigar todos a seguir o que nós seguimos.

“Eu gosto disso, então você é obrigado a concordar comigo, com toda certeza. Se você não acha, você está errado.”

Com esse tipo de pensamento, guerras já foram iniciadas. Mas, mesmo sabendo disso, nos vemos discutindo, gritando, berrando aos quatro ventos. Por que? Por que o ser humano é assim. Eu não tenho a chave da mudança, por isso vou limitar meu discurso a tentar explicar os porquês que me fizeram gostar do longa. A sua opinião fica por sua conta.

COMEÇANDO COM OS PROBLEMAS

Vou ser honesto com você: a maneira como o filme foi montado me irritou bastante. Confesso que fiquei um pouco confuso nos primeiros quarenta minutos, já que algumas das cenas simplesmente brotavam na tela sem nenhum contexto, e isso quase me fez odiá-lo. Mas o sentimento durou pouco. Quando entrei no clima e entendi o que estava acontecendo, aceitei com alegria.

Pra seguir no pique, vou começar falando dos problemas, por que eles são poucos. Dois, na verdade: a montagem e o Lex Luthor. A montagem, principalmente a inicial, parece preguiçosa demais, talvez até mal feita, jogando informações na nossa cara sem pudor. Depois de uma curta análise, passei a supor que, na verdade, houveram muitas cenas cortadas e foi isso que deu origem a toda essa confusão. Vamos aguardar a versão estendida.

Já o Lex, o problema não está na forma como ele foi mostrado, como um gênio do Vale do Silício, e muito menos na atuação, afinal Jesse Eisenberg está incrível. O problema verdadeiro está em suas motivações. O que o levou a querer ver o Super morto? Isso não fica claro em momento algum. Me pareceu mais inveja do que qualquer outra coisa.

Jesse Eisenberg: Lex Luthor do Vale do Silício
Jesse Eisenberg: Lex Luthor do Vale do Silício

Se você queria ver aquele Lex Luthor clássico dos desenhos e das HQs, sugiro que assista a primeira temporada do Demolidor, na Netflix, porque o Rei do Crime do Vincent D’Onofrio se parece muito mais com ele, tanto física quanto mentalmente, do que o próprio Eisenberg. O que vemos aqui, na verdade, é um pirralho mimado, que nada em dinheiro e não tem nada mais interessante para fazer da vida.

Vemos um cisco de mágoa quando ele se refere ao pai, “O verdadeiro Lex antes do Corp”, mas isso não é aprofundado em momento algum. Na verdade, fica difícil saber até mesmo o que a LexCorp faz.

Bem… Esses são os dois maiores problemas do filme, pra mim. E, dito isso, vamos para o que realmente importa. As partes boas. Ou melhor: O Batman!

EU SOU O BATMAN

A melhor coisa do filme, com toda certeza, é o grande aprofundamento na personalidade complexa e perturbada do Bruce Wayne. As cenas são apresentadas de uma forma que fazem com que você compreenda tudo que ele passou e ainda está passando. O ódio pelo Superman se torna justificado. Mais do que isso. Justificável.

E esse foco no homem por de trás da máscara do morcego não diminuiu de forma alguma o papel do Batman. Muito pelo contrário. Deixou suas ideias ainda mais completas. Vemos um Bruce amargurado, quase alcoólatra e perdendo todo o contato com a raça humana. Justamente nesse momento que suas maiores habilidades afloram, tanto que ele consegue descobrir uma forma de lutar de igual para igual com um deus alienígena.

O melhor Batman de todos os tempos
O melhor Batman de todos os tempos

O Batman, como super-herói, também me surpreendeu em quase todos os detalhes. E o principal deles, pelo que andei lendo, incomodou a maior parte dos puritanos: ele usa armas de fogo e não tem o menor problema em matar bandidos. Mas onde está a inconsistência nisso?

Muita gente se esquece do fato de que aquele Batman já assume a capa e o capuz há mais de vinte anos. Ele já viu seu companheiro Robin ser assassinado pelo Coringa. Ele já passou pelas piores dores e sabe muito bem o que faz. Isso não me incomodou em momento algum. Muito pelo contrário. Me fez sentir a dor do personagem ainda mais. Me fez entender um pouco da sua completa falta de fé na humanidade.

Pela primeira vez, ao menos no cinema, nós vemos um Batman seguro de si, consciente dos seus atos e agindo como detetive. O excesso de sonhos malucos me estressou por um tempo, mas logo entendi que eles eram úteis para mostrar como o personagem estava sofrendo.

O melhor uniforme do Batman no cinema
O melhor uniforme do Batman no cinema

O figurino também me surpreendeu muito. Nada de armadura que mais parece feita de pneu de caminhão, como nos 3 últimos longas. Nada de collant com mamilos. Mas também não era a roupa de tecido frágil que eu imaginava, quando via os trailers. Ela é uma espécie de armadura, pois rebate projéteis, mas, ao mesmo tempo, foi perfurada por uma faca. Isso é um erro? Talvez. Mesmo assim, é o melhor figurino do morcego de todos os tempos.

Mas, se por um lado o Batman se mostrou maduro, consciente e focado na ideia de conter a ameaça, o Superman, por outro lado, parece mais uma criança mimada. O seu anseio por criticar o Batman, chamando-o de justiceiro – no pior sentido da palavra – me soou mais como inveja do que preocupação. Afinal, ele próprio age como justiceiro o tempo todo.

Superman mimadinho...
Superman mimadinho…

Isso faz com que a ideia do Batman se fortaleça. O poder está subindo na cabeça do Superman e ele realmente precisa ser contido. A impressão que fica é que a mudança da vigilância para a contenção se dará em breve e tudo é apenas uma questão de tempo.

A MARAVILHOSA MULHER

Gal Gadot, com sua beleza exótica, assume o filme como se fosse dela. É mais uma representante do novo – e ainda fraco – modo de fazer filmes, que mostra as mulheres como elas devem ser: fortes, destemidas, e não apenas frágeis donzelas que precisam ser salvas.

Gal Gadot, a maravilhosa mulher...
Gal Gadot, a maravilhosa mulher…

A princesa Diana rouba a cena em quase todos os momentos em que aparece, provando que uma mulher pode sim ser sensual, mas que essa não é a única arma que precisa usar para alcançar seus objetivos. Sua participação é muito boa, embora eu precise admitir que a sua presença ali seja levemente jogada. Eles optaram por não explicar nada.

AS REFERÊNCIAS

Este assunto mereceria um texto exclusivo, afinal, são muitas as ideias apresentadas de leve, seja como homenagem, seja como mero easter egg. A mais interessante de todas, para mim, é a participação mais do que especial do Neil deGrasse Tyson. Se ele já era o cientista mais foda do mundo real, agora também é o mais foda da ficção. Gritei quando ele apareceu.

Neil deGrasse Tyson
Neil deGrasse Tyson

O longa também conseguiu fazer ótimas referências à vindoura Liga da Justiça. Eu fiquei muito empolgado mesmo! As participações de Ezra Miller como Flash, Ray Fisher como Cyborg e, principalmente, Jason Momoa como Aquaman, são espetaculares, ainda que muito discretas. Conseguem dar um pouco de noção do que podemos esperar. E eu já estou esperando ansiosamente.

A cena inicial já marejou meus olhos logos nos primeiros segundos, por ser exatamente IDÊNTICA a apresentada na HQ “O Cavaleiro das Trevas”, de Frank Miller. Na verdade, todas as cenas da sequência inicial, que acontecem em Metrópoles, me deixaram de boca aberta. Elas mostram os acontecimentos de O Homem de Aço, mas vistos de um outro lado, nos fazendo sentir o que os cidadãos comuns sentiram. Mostrando este contexto, a raiva do Batman se torna mais do que justificada.

Outra homenagem ao Cavaleiro das Trevas ocorre quando Alfred pega Bruce bebendo novamente. Ele comenta que espera que a próxima geração de Waynes não herde uma adega vazia. O sorriso se estendeu ainda mais no meu rosto.

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RESUMINDO…

Eu não preciso dizer mais uma vez que gostei muito do filme, não é? Não sou o maior fã do Batman, mas este apresentado por Ben Affleck, pela primeira vez, conseguiu me convencer. Eu acreditei no seu propósito. Eu senti a sua dor.

O filme tem problemas? É claro. Até “O Poderoso Chefão” tem problemas. A questão é que os problemas não são maiores do que o filme em si. Se todos os seus argumentos se resumem a: “Isso é diferente dos quadrinhos” então você não tem argumento nenhum. Cinema e HQs são coisas diferentes.

O importante é aceitar que somos pessoas diferentes, com opiniões e ideais diferentes. Não precisamos nos digladiar como os protagonistas deste longa. Afinal, como nossa mãe já nos dizia tanto tempo atrás:

“Violência não leva a nada. É conversando que nos entendemos”.

Nos vemos em breve.