Como em todos os nichos, o número de homens no mercado cinematográfico é significativo, mas o espaço da mulher nos bastidores se amplia gradativamente.

Alguns amantes da sétima arte tem a tendência de lembrar somente os nomes de diretores homens, nacionais e internacionais, e detalhadamente explicam com convicção de como se apaixonaram pelos belos e históricos enquadramentos dos mesmos. Mas devemos ter consciência de que inúmeras diretoras foram pioneiras no crescimento do cinema mundial, como a incrível francesa Alice Guy-Blache.

Sendo assim, é transparente a omissão na distribuição de filmes dirigidos por mulheres. E baseado na hierarquia presente no audiovisual, o Brasil é responsável por uma porcentagem abaixo de 15%. A luta é fragmentada, pois longas-metragens dirigidos por elas ganham representação somente em festivais e mostras, como se fossem descobertas de nichos diferenciados, já sendo um grande equívoco. A mulher é desencorajada na roda intelectual do cinema, e por isso, cada vez mais, quebram o estereótipo de que serão somente ótimas produtoras, atrizes e diretoras de arte.

O movimento feminista ainda se constrói, presenciando diversas transformações, e consequência disso, dissolve a ideia do papel da mulher cliché para questões sociais, psicológicas e culturais.

Felizmente, como o movimento, o número de mulheres no campo cinematográfico se eleva, mas ainda de forma irregular – mesmo cenário onde muitos projetos foram criticados e engavetados. E como já citado, nas mostras e festivais, diretoras debatem sobre a temática e a visibilidade na igualdade de gênero, e também, muitos filmes que enaltecem o poder feminino ganham influência internacional.

Petra Costa também é atriz. Diretora do filme “Elena” e do “Olmo e a Gaivota”
Petra Costa também é atriz. Diretora do filme “Elena” e do “Olmo e a Gaivota”

Diretora e o filme escolhido:

Falando sobre influências culturais e visibilidade, em “Mulheres na Direção Cinematográfica”, inaugurarei com um dos meus documentários favoritos: Elena (2013)

Dirigido pela brasileira Petra Costa, o documentário conta a história de Elena, a filha mais velha de um casal. Ela se muda para os Estados Unidos, e lá, tentará realizar o seu sonho: ser atriz. Viveu uma vida intensa, e por ser artista e viver os sentimentos à flor da pele, deixou o seu sonho e partiu. Petra, a diretora, é sua irmã caçula e, com uma linda cinematografia, nos mostra como a vida de sua irmã foi um turbilhão de emoções até o fim. Elena deixa rastros em diários, poesias e filmes.

Quando ver esse filme prepare-se, pois ficará aos prantos. Não, eu não digo por infelicidade, mas sim, como nossas próprias memórias podem virar pura poesia. Uma empatia questionável, mas estranhamente aconchegante. Atrás de várias referências literárias, Elena nos cede a visão da intensidade que a insaciável busca pela equilibro nos molda. Elena não era triste, ela só vivia o trivial com uma imensidão de emoções. Uma alma velha presa no corpo de menina, vivendo os últimos suspiros de um ciclo que sua consciência já vinha atravessando. É incrível a delicadeza que a diretora lida com a temática, e o quão difícil é distinguir fragmentos da vida de Petra e a de Elena, como se uma fosse a continuação da outra. Uma declaração de amor pela artista e pela nobre arte.

Frame de Elena, foto baseada na morte de Ofélia em Hamlet, de William Shakespeare.
Frame de Elena, foto baseada na morte de Ofélia em Hamlet, de William Shakespeare.

Ganhou diversos prêmios pelo mundo, entre eles: 45º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro (Melhor direção, Melhor montagem, Melhor Direção de Arte e Melhor filme pelo júri popular; Films de Femmes 2013 (Melhor Documentário); 10º Planete+ Doc Film Festival Varsóvia – (Prêmio Canon de Cinematografia);  6º Los Angeles Brazilian Film Festival (Melhor Documentário); 9º Festival Internacional de Cine Documental de la Cuidad de México (DocsDF)  (Melhor longa-metragem latino-americano); 35º Festival Internacional de Nuevo Cine Latinoamericano – Havana, CUBA (Melhor Documentário) 40º Festival Sesc Melhores Filmes – São Paulo, BRASIL (Melhor documentário votação do público); 13º Grande Prêmio do Cinema Brasileiro – Rio de Janeiro, BRASIL (Melhor documentário – votação do público – e Melhor Montagem – Marilia Moraes e Tina Baz); 4º Arlington International Film Festival (AIFF) – Estados Unidos (Melhor Filme).

“(…)A mãe pressente. Petra decifra. Agora que finalmente encontrou Elena, Petra precisa deixá-la partir.”

Elena e Petra.
Elena e Petra.

Um excelente documentário que não só ficou nas salas de cinema, como também nas estantes literárias, contendo o roteiro do filme, fotos e depoimentos. Possui uma forte representatividade feminina, em frente e atrás das câmeras, digno de debates sociais e questões contemporâneas.

A conscientização do feminino no mercado cinematográfico é carregada de arte e sensibilidade. A representação da mulher no audiovisual deve ser revolucionária e contínua.

A sétima arte, como sempre, é mais que um mero entretenimento.