Assistir um filme por obrigação é uma das experiências mais desgastantes para mim. Ainda que seja apaixonado pela sétima arte e compulsivo por conhecer novas histórias, sempre que um professor me diz “Assista tal filme e escreva sobre” sinto um frio na espinha. Isso pelo simples fato de que, quase sempre, o filme escolhido é ruim. Todo o meu respeito aos professores, mas eles adoram filmes ruins, e eu nunca entendi porquê.

Dito isso, vocês imaginam meu desespero quando recebi, na semana passada, a tarefa de assistir a um clássico dos anos 70 que, hora vejam só, fala sobre política. Mas, como bom aluno que sou, me despi dos preconceitos e parti para a jornada.

Foi então que veio a surpresa: O filme era bom.

O longa em questão se chama Todos os Homens do Presidente e foi lançado em 1976, apenas 4 anos após o polêmico fato que retrata, o Caso Watergate, que culminou na renúncia do então presidente americano Richard Nixon. Esse curto período de tempo poderia ter inflamado os ânimos dos idealizados, fazendo com que tomasse decisões equivocadas na escolha dos fatos que seriam mostrados, mas, ao que tudo indica, esse não foi o caso.

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Ao contrário disso, a história se foca nos argumentos concretos, deixando os rumores e as licenças poéticas de lado. O simples recurso de se utilizar de imagens reais de reportagens da época já ajuda a criar um clima mais realista e crível.

A história segue o trabalho de Bob Woodward e Carl Bernstein, dois repórteres do The Washington Post e tenta explicar em detalhes como eles revelaram ao mundo um dos maiores escândalos da política mundial. Em detalhes mesmo, já que uma das cenas onde Bob liga para diversas pessoas em busca de informações dura quase 20 minutos. Extremamente bem amparado por documentos da época, o longa documenta o fato ao mesmo tempo que entretém com as ótimas atuações de Robert Redford e Dustin Hoffman.

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Em contra partida, uma das coisas que o filme não deixa muito claro é o fato de que a investigação dura dois anos, e não apenas alguns dias, como aparenta. Entre a invasão do edifício Watergate na madrugada de 18 de junho de 1972, a primeira cena do filme, até os esclarecimentos finais e a renúncia do presidente Nixon, muita coisa aconteceu e o filme não deixa essa passagem de tempo claro.

Depois de todo o trabalho, os repórteres acabam provando que os invasores estavam a serviço do Partido Republicano e tentavam obter informações confidenciais sobre o candidato democrata George McGovern. E o presidente Nixon não só tinha conhecimento destes fatos como teria feito um caixa dois para bancá-las. O objetivo principal desta estratégia era encontrar algum podre do candidato rival para usar durante a campanha eleitoral. Algo muito comum, diga-se de passagem.

Um recurso muito interessante usado pelo diretor se dá nas aparições do Garganta Profunda, personagem interpretado por Hal Halbrook. Ele é a testemunha chave das investigações e para preservar sua identidade, aparece sempre envolto em sombras. Ao mesmo tempo, podemos dizer que é ele quem traz a luz para a investigação e este recurso semiótico acrescenta bastante ao filme.

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DIREÇÃO E PARTE TÉCNICA

A direção de Alan J. Pakula (A escolha de Sofia) cumpre bem o papel de explicar o trabalho de um repórter passo a passo, mas isso também faz com que o filme tenha um ritmo anormalmente lento. Ainda que essa seja uma característica forte dos filmes da época, tal lentidão pode afastar – ou adormecer – os espectadores menos atentos.

A direção de fotografia, embora seja muito bonita, não chega a impressionar. A escolha por takes mais sombrios para ambientar as cenas e construir o clima cumpre seu papel, mas também já era esperada. Já a direção de arte, esta sim merece crédito. A redação do jornal é incrivelmente viva e nos transpõe para aquele mundo.

O roteiro escrito por William Goldman, que mais tarde escreveria a biografia de Charles Chaplin, foi baseado em um livro também chamado Todos os Homens do Presidente, lançado em 1974, e escrito pelos verdadeiros Bob Woodward e Carl Bernstein, os repórteres protagonistas de toda a trama.

O longa recebeu oito indicações ao Oscar e ganhou quatro delas: Melhor Ator Coadjuvante, Melhor Direção de Arte, Melhor Som e Melhor Roteiro Adaptado

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CONCLUINDO

Todos os Homens do Presidente é um bom filme e eu jamais discordaria disso. Porém, alguns detalhes incomodam. O ritmo lento é um destes detalhes. O foco exagerado no trabalho dos repórteres também pode ser encarado como um problema, mas isso se torna uma contradição ao considerarmos o fato de que a história é exatamente sobre isso: como os repórteres solucionaram o caso.

As inserções reais acrescentam dinamismo, dando um leve ar documental, mas isso não é suficiente para torná-lo mais agradável. E, ao contrário de outros filmes da época, este longa é quase impossível de ser encontrado. Para esta análise, aluguei a minha cópia pelo canal da Warner Bros no YouTube pela módica quantia de R$ 3,90, mas como bom colecionador, gostaria de adquirir uma cópia física e, ao que tudo indica, isso não é possível há muitos anos.

Isso é triste, afinal, o filme merece ser visto nos dias de hoje, principalmente pelo seu contexto, que é extremamente atual. Apesar de tudo ter acontecido há mais de 30 anos, a corrupção na política permanece a mesma, tanto lá quanto aqui. Principalmente aqui no Brasil, na verdade.

E os jornalistas continuam nos provando isso.